Em A Piada Mortal, Alan Moore nos apresenta uma história onde o Coringa está disposto a provar que qualquer um, num dia ruim, pode se tornar um psicopata como ele e usa o Comissário Gordon como cobaia para essa experiência macabra. No S04E11, Walter White tem um dia muito ruim. Ele não tem mais a parceria com Jesse, ele não é mais insubstituível na produção de drogas, ele não conta com a simpatia de seu chefe criminoso, ele não tem mais dinheiro pra fugir para uma nova vida e, em breve, ele não terá mais sua família (provavelmente assassinada por Gustavo como ele, pessoalmente, prometeu). No exato instante em que Skyler White diz que deu $600k a seu ex-chefe Ted (ato que na minha opinião faz todo o sentido com as informações que ela dispunha em mãos), nosso amado-odiado químico entra em surto. Assistimos o sujeito no porão(?) de sua casa, entre olhos roxos, esparadrapos e terra, rir descontrolado como o Coringa de Moore. Walter não tem mais nada a perder e eu já imagino as consequências futuras.
A temporada anterior terminou no tiro fatal de Jesse em Gale (que descobrimos ter sido o autor da ideia de trazer Walter ao laboratório já que era um fã do seu trabalho). O início da S04 é uma escalada de crises onde eu, definitivamente, não sei se Walter está protegendo Jesse ou tentando reforçar seu poder frente ao chefe, o traficante Gustavo. Breaking Bad sempre teve cenas de tensão crescente capazes de deixar qualquer um apreensivo (como os irmãos Salamanca entrando silenciosamente na casa de Walter com um machado na S03). Mas dessa vez a coisa toda sobre uns três, quatro, mil tons. O 1º episódio tem a dupla presa no laboratório com os capangas Mike e Victor esperando uma orientação de Gus. Depois de estarem lá aguardando a morte há muito tempo, Fring chega sem dar uma só palavra, troca de roupa, pega o estilete de Gale, corta o pescoço de Victor e o segura até ele morrer. Todos estão chocados (até Mike) enquanto tranquilo, ele troca suas roupas e sai para só na porta dizer: “voltem ao trabalho”. TENSO! E para piorar o clima, os motivos da morte de Vítor não são nada claros… foi porque ele deixou Gale morrer? Porque ele foi visto na cena do crime? Porque ele estava produzindo metanfetamina achando que sabia a receita de Walt? Não sabemos. E aparentemente não importa. Gustavo se mostra tão frio na execução quanto é nos negócios. Com frieza inteligência, recursos e homens na sua segurança, Gus é um adversário imbatível pra Walter. E a dupla entende que naquele dia só adiaram a morte. Enquanto o empresário estiver vivo ele vai buscar uma forma de matar a dupla. Ou um deles.
Mais uma vez cada um reage a sua maneira: Jesse volta a rotina de drogas sem fim (só interrompidas pelo trabalho no laboratório) e Walter dedicado a matar o chefe. Quando Mike avisa que a vida louca de Jesse está se tornando um risco, Fring dá o direcionamento preciso para mudar os rumos do trato com a dupla. Em vez de insistir em cooptar Walter e apenas suportar o “peso” Jesse, ele passa a abraçar Pinkman e destratar White. O traficante faz exatamente o contrário do que o ex-professor sempre fez (uma chuva de críticas e insultos) ao ex aluno. Mike mantém Jesse longe das drogas, Gustavo diz acreditar no potencial dele (“eu vejo algo nas pessoas”), eles o elogiam quando ele enfim começa acertar… e, aos poucos, trazem a dúvida pra cabeça de Jesse. Por outro lado, isolar Walt e deixá-lo perceber que o sócio está com mais “moral” com o chefe é cutucar o ego dele… e basta esperar uma faísca para que tudo exploda. “Não pode ser… Isso tudo é sobre mim.” diz o professor enquanto tenta entender o que Gustavo pode querer com Jesse.
Esse isolamento e a necessidade de ser visto e reconhecido levam nosso amigo químico a cometer alguns atos que colocam seu estilo de vida criminoso em risco: 1. dizer a Hank que, baseado nas anotações de Gale, ele NÃO ERA o grande Heisenberg que o policial procura (e acabar colocando o cunhado de volta na investigação que ele já dava como encerrada) e 2. Comprar um Challenger para o filho de presente (que pode ser uma brecha no futuro pra origem desse dinheiro já que Walt Jr contou a Hank). Vale lembrar que é a investigação da morte de Gale que coloca Hank de olho em Gustavo Fring pela primeira vez (no ap do químico vegano tinha uma sacola dos Pollos Hermanos com um serial de um exaustor industrial encomendado para o laboratório e depois Hank descobre digitais do empresário na cena do crime). Mas Walter não fez só besteiras em nome da vaidade. Com medo, ele tentou a ajuda de Saul pra matar Gus e recebeu a dica de usar o “desaparecedor” para sumir com a família e inventar outra vida longe de tudo. Walter não aceita, insiste no plano solo e consegue envolver Jesse, que agora tem acesso ao chefe. O problema é que quanto mais Jesse é envolvido no plano de Gustavo mais ele se distancia de Walter… e ele hesita mais de uma vez. Jesse mente várias vezes dizendo que não teve oportunidades até que o professor descobre as mentiras do sócio. O problema é que isso acontece no meio de uma crise entre Gustavo e o Cartel mexicano que culmina com uma consultoria de Jesse no meio do laboratório mexicano. Essa é principal cisão da dupla até o momento: Jesse (em pânico pedindo ajuda com medo de ir até o México sem orientação) e Walter (transtornado pensando que está sendo traído) saem na porrada.
Depois de enfrentar o químico mexicano, produzir uma ‘fornada’ de metanfetamina com 96,5% de pureza (abaixo do 99,1% de Walter mas MUITO acima do mercado normal) e assistir incrédulo a Gustavo envenenar toda a cúpula do cartel de uma vez só (e no México!), Jesse volta aos EUA puto com Walter mas ainda disposto a preservar a vida do sócio.
A inversão de situações nesta temporada é curiosa: a cadeira de Pinkman que sempre foi o inseguro, emocionalmente instável, descartável para os negócios e protegido dos criminosos por Walter para a ser ocupada pelo professor. Só que a pressão de Hank nos calcanhares de Gustavo Fring e a insistência de Walter fazem o empresário levar Walter para o deserto com capuz preto na cabeça e proferir sua sentença de morte: Walter não pode ver Jesse, não pode falar com Jesse e, como não interrompeu a investigação de Hank, Gustavo vai mata-lo e se Walter falar algo ele vai matar toda a família White. Tentativa de fuga frustrada do químico, interrompida pela decisão de Skyler citada no início do post, o coloca numa situação impossível que leva termina em surto. Dali por diante temos um Walter sem amarras que entrega a família a proteção policial e faz de TUDO para sobreviver e matar o (agora) ex-chefe. Conseguir a ajuda de Hector ‘Tio’ Salamanca que nutre um ódio absurdo por Heisenberg como aliado no plano de vingança contra Gustavo é uma jogada de mestre. Mas a explosão do empresário não me causou tanto choque quanto ver que Walter envenenou Brock (filho de Andrea com quem Jesse voltou a se relacionar depois de se livrar das drogas de novo) para incriminar Gus e contar de novo com a ajuda de Jesse. Graças a mentira os sócios voltam a ficar bem e, com Gustavo morto todos deveriam estar tranquilos… mas a imagem que encerra a temporada é o Lírio do Vale no quintal da família White e mostra que o professor abriu mão de qualquer valor para conseguir o que quer. E isso tende a piorar na última temporada. O que pode ser mais perigoso que o psicopata com ego gigante e que não tem nada a perder?
Continua…
Caso tenha perdido as impressões sobre a S01 veja aqui, sobre a S02 aqui e a S03 aqui.